Matias/Mateus Capítulo 16

13 Quando, pois, veio Yeshua à região de Cesareia de Filipe1, perguntou aos discípulos, dizendo:

— O que estão dizendo a meu respeito, que sou o Filho do ser humano?2

14 Eles, então, disseram:

— Dizem [alguns] que é João, o imersor, outros, porém, dizem que é Elias, e outros Jeremias ou algum dos profetas.

15 Disse-lhes ele:

— Vocês então, quem dizem que eu sou?

16 Respondeu Simão Kêfa, e disse:

— Tu és o Ungido, o filho do Deus vivo!

17 Respondeu Yeshua, e disse-lhe:

— Bendito sejas, Simão, filho de Jonas3; a carne e sangue não revelaram isso para você, mas o Pai Celeste.
18 Também eu te digo: tu és Kêfa; sobre esta pedra4 construirei minha comunidade5, e os portões da sepultura6 não se firmarão7.
19 Para você darei as chaves do reino do CÉU; todas as coisas que forem atadas8 na terra, serão atadas nos céus, e qualquer coisa que for desatada na terra, será desatada nos céus.

20 Então mandou aos discípulos que a ninguém dissessem que ele é o Ungido.


[1] 16:13. Cesareia de Filipe era uma antiga cidade localizada no sopé sudoeste do monte Hermon, na atual região arqueológica de Banias. Quando Herodes, o Grande, morreu (entre 6-4 AEC) a cidade ficou nas mãos de seu filho, Herodes Filipe, que a ampliou, e embelezou, e a chamou de Cesareia de Filipe, para alcançar graça diante seu imperador Tibério César, e distingui-la da outra Cesareia, a capital romana na Judeia e porto marítimo muito mais conhecida, que ficava na costa. É hoje um local arqueológico perto da fronteira Israel-Síria, junto à nascente do rio Jordão.

[2] 16:13. A expressão aram. בַר אֱנָשׁ (bar enash) corresponde à hebraica בֶּן־אָדָם (ben adam), e ambas significam “filho do ser humano” (homem no hebraico é אִישׁ (ish) e não אָדָם (adam)). Bar enash ganhou um significado especial desde os tempos do profeta Daniel (séc. VI AEC), pois se refere à profecia do cap. 7:13-14, escrito em aramaico (em 8:17 consta a expressão escrita em hebraico). Tal profecia diz respeito ao ser humano a quem seria dado o governo do reino eterno de Deus entre os homens, em todas as nações. Daniel também registrou profecias acerca da época em que este homem apareceria no mundo (9:25), por isso havia, no tempo de Yeshua e seus discípulos, tanta expectativa pela manifestação deste, vide Lc 3:15, Jo 1:19-20.

[3] 16:17. Algumas traduções dizem “Simão Barjonas” (A21, ARA, ACF, KJF, TB), outras “filho de Jonas” (BDJ, BPT, KJA, NVI, OL). A NVT e a VFL dizem “filho de João”, seguindo Jo 1:42 e 21:15 em algumas traduções as quais, por sua vez, seguem apenas 0,5% dos mss (manuscritos) gregos. A palavra aramaica “bar” significa “filho”, e o nome do pai de Simão era Yoná, de onde vem a versão grega Ιοανας (Ioanas), e por fim Jonas em português.

[4] 16:18. Aqui há um trocadilho no idioma original: הוּ כּאִפָא ועַל הָדֵא כּאִפָא אֵבנֵיה (hu kipha’ val hade’ kipha’ evneyh) – isto é, “tu és Kipha (uma pedra), e sobre esta kipha (pedra) construirei …” Ou seja, Yeshua disse que Simão era uma pedra, e sobre outra pedra, que é a declaração que Simão disse anteriormente (v. 16), de que Yeshua é o Messias, seria construída a comunidade dele. Então Simão era uma pedra dentro de uma construção maior.

[5] 16:18. As bíblias comuns infelizmente são tendenciosas na tradução deste versículo, e apresentam aqui uma das maiores desonestidades na tradução do texto bíblico. Pois nem mesmo a palavra ἐκκλησία (ekklesia), encontrada na tradução grega aqui, significa uma determinada instituição religiosa, tal como os tradutores tentam incutir na mente de seus leitores. O próprio Dicionário Bíblico Strong (G1577) informa que ekklesia trata-se de uma reunião de cidadãos chamados para fora de seus lares para algum lugar público, uma assembleia do povo com o fim de deliberar alguma questão social, ou qualquer ajuntamento ou multidão de homens reunidos por algum motivo. Ekklesia era uma palavra comum usada na Grécia para definir as reuniões públicas dos gregos. Esta palavra já havia sido usada na Septuaginta, a primeira tradução grega das Escrituras Hebraicas, feita por intérpretes e sacerdotes judeus por volta do ano 283 AEC, até mesmo para descrever a congregação do povo de Israel; veja, por exemplo, os seguintes vs. nela: Lv 8:3, Nm 20:8, Dt 4:10, 9:10, 18:16, 23:1-3,8, 31:30, Js 8:35, 18:1, Jz 20:1, 21:5 e muito mais. Ademais, em Atos 7:38, a mesma palavra é usada (no texto grego) se referindo à congregação do povo de Israel. Portanto, a comunidade do Messias Yeshua, que ainda estava surgindo, não é uma instituição religiosa ou uma religião específica, mas é constituída de todas as pessoas que seguem seus ensinamentos. No texto aramaico, idioma que ele falava neste momento, consta a palavra עִדּתָּא (‘idtha’), que indica uma comunidade organizada e estruturada. Por exemplo: eles tinham uma liderança central em um local definido, conforme foi estabelecido na própria Torá, a Lei de Deus, vide At 15:1-2, 21:17-18, Gl 2:1-2,9-10, Dt 17:8-10. Nas comunidades fora de Jerusalém, tinham líderes israelitas instruídos nas Escrituras Divinas para orientar tanto os discípulos judeus quanto os estrangeiros, veja At 11:19-26, 13:1 (cf. 4:36, 22:3), Rm 16:3-5 (cf. At 18:1-4), 1Tm 1:3 (cf. At 16:1-2), Tt 1:5 (cf. 2Co 8:23) etc. Também tinham líderes que cuidavam das questões básicas da comunidade, veja At 4:34-35, 6:1-7, 11:28-30. Tinham dias e horários específicos para oração e estudo da palavra divina, conforme já determinado pela tradição judaica, veja At 3:1, 10:30, 13:14-15, 16:12-13. As pessoas tinham funções específicas na comunidade, que a completavam como um todo, e deveriam ter unidade uns com os outros; vide Rm 12:4-8, 1Co 12:4-30, 14:23-33, dentre vários outros elementos que foram preservados nas estruturas comunitárias ao longo dos séculos por sua tradição. Além do mais, a comunidade de discípulos dele não abandonou costumes, mandamentos e tradições que Deus deu ao Seu povo, Israel, o contrário do que é ensinado em certas interpretações teológicas mundo a fora, basta ver os seguintes versículos e deixar o texto bíblico falar por si mesmo: At 28:17, 25:8, 24:14, 21:20-26, 20:16, 18:18,21,26, 17:1-3,10-11, 16:13, 14:1, 13:5,14-15,42-43, 5:42, 3:1, 2:46, Lc 23:54-56 etc.

[6] 16:18. A expressão ותַרעֵא דַּשׁיוּל (vthare’ dashyul), “os portões da sepultura”, que o Mestre usa aqui, corresp. ao heb. שַׁעֲרֵי שְׁאֹול (shaa’rey sh’ol), encontrada nas Escrituras somente em Is 38:9-10, no cântico que o rei Ezequias recita após Deus curá-lo de uma doença mortal. Uma expr. parecida, de mesmo significado, também é encontrada em Jó 38:17, Sl 9:13 e 107:18, sendo שַׁעֲרֵי־מָוֶת (shaa’rey-mavet), isto é, “porta da morte”, designando alguém que está irremediavelmente perto de morrer. Essa, certamente, é uma assimilação que o Senhor faz com a sua comunidade, que por muitas vezes chegaria próximo à morte, isto é, ao fim de sua existência; mas esta não prevaleceria sobre ela. Com as guerras judaicas que aconteceram a partir do ano 66 EC, a queda de Jerusalém e seu templo, várias perseguições ao povo de Israel se levantaram ao longo dos séculos seguintes, até mesmo a Inquisição Cristã Católica, esp. na Espanha e Portugal, que tentaram eliminar a identidade (bíblica) do povo judeu. Isso, naturalmente, envolvia a comunidade que Yeshua fundou. Este povo chegou perto de desaparecer, mas os portões da sepultura não puderam prevalecer contra ele! E ei-lo aí vivo.

[7] 16:18. Outras traduções: não se fortalecerão, não superarão, não vencerão, não dominarão, não derrotarão, não triunfarão, não subjugarão, não possuirão, não manterão seu poder, não se confirmarão. O final que aparece no texto grego, κατισχύσουσιν (katiskhusousin) αὐτῆς (autes) – “contra esta”, não consta no texto aramaico.

[8] 16:19. Atar, amarrar ou proibir. É dito דּתֵאסוּר (dte’sur) no aram. Corresponde à amarrar ou acorrentar alguém para prisão, ex. Gn 42:24, 2Cr 33:11, Jr 52:11 (cf. 2CD 3:34); outro ex.: amarrar/atar feixes de trigo, Gn 37:7; aprisionar alguém, Gn 40:3, Lv 24:12 (cf. Is 49:9); amarrar algo, Gn 49:11, 1CD 6:10, Os 10:10; enrolar, Ez 27:24; também pode ser usado no contexto de cingir-se militarmente, cf. Dt 14:1, ou de outra forma, Gn 37:34.

Escreva seu comentário;